sexta-feira, 29 de maio de 2020

POSIÇÃO DO SIMSED SOBRE O ANO LETIVO, CANCELAMENTO DO ENEM E AULAS REMOTAS EM GOIÂNIA.



POSIÇÃO DO SIMSED SOBRE O ANO LETIVO, CANCELAMENTO DO ENEM E AULAS REMOTAS EM GOIÂNIA.


A pandemia da Covid 19, ainda que tenha surgido no final do ano passado – 2019 -, chegou no Brasil em março de 2020 sem que estivéssemos preparados para enfrentá-la em diversos aspectos, como o da Saúde, da Economia e também da Educação. Vários elementos que antes eram regulamentados de uma outra maneira, agora sofreram alterações bruscas. As respostas do Estado foram repentinas, sem muito tempo para uma organização coerente e sensata, que atendesse aos interesses dos estudantes e dos trabalhadores da educação. Algumas das supostas soluções do Estado são questionáveis, como é o caso da Educação Remota, em que a maioria dos estudantes, por falta de recursos e por suas condições sociais, não tem os aparelhos e acesso individual para as aulas à distância (EAD). O problema também se manifesta com os professores, pois como grande parte dos gestores nunca tiveram uma atenção para subsidiar ferramentas adequadas para a implementação das novas tecnologias dentro das escolas, encontram grande dificuldade em tal modalidade de ensino.

Com a chegada do vírus e a necessidade do isolamento social, muitas experiências foram implementadas, sem um preparo anterior, motivadas apenas pelo ímpeto do momento. Entretanto, muitas perguntas estão sem respostas e muitas outras sendo colocadas em cheque, como o caso do ENEM, a Seleção dos Institutos Federais (IF), o Ano letivo e tantas outras que precisam ser respondidas. Porém, as respostas a tais questionamentos precisam estar ancoradas na ampla participação da comunidade escolar e profissionais da educação, o que não ocorreu até agora, pois todas as medidas adotadas vieram de cima para baixo, elaboradas por gestores e sem a consulta e debate com os mais interessados – comunidade escolar e trabalhadores da educação. Nunca, como agora, é preciso defender a participação da comunidade escolar e trabalhadores da educação na reflexão sobre as decisões governamentais, para garantir a inclusão e participação de todos no processo educacional. Mas, ao contrário disso, os gestores têm tomado decisões sempre precipitadas e sempre em desfavor do povo pobre, que intensificam ainda mais a exclusão destes dentro do processo educativo institucional.

Há uma ilusão em alguns setores gerenciais de que se possa – como quem muda um interruptor – transferir para o interior das famílias a continuidade da educação dos filhos que estava em curso nas escolas, bastando para isso a tecnologia. Várias secretarias municipais e estaduais recorreram às aulas remotas para dar continuidade ao processo educativo. Porém, tal processo, em muitos lugares, desconsiderou a realidade dos estudantes que não tem acesso à internet, um dos principais meios de realização dessas aulas à distância. Também ignorou outras dificuldades que as famílias enfrentam, como a falta de um local adequado para os estudos em casa, mesmo os problemas psicológicos decorrentes da crise pandêmica e do isolamento social, além da sobrecarga sobre os pais e as crianças com a quantidade excessiva de atividades, que levam a um ambiente de estresse, foram desconsiderados pelos gestores públicos.

Entendemos que essas aulas remotas não podem substituir o ano letivo, pois não oferecem um processo de ensino aprendizagem integral. É através da interação do estudante com o professor e destes com os seus próprios colegas que a aprendizagem é construída, algo que é bastante limitado quando se trata das aulas remotas, em que o estudo se torna individualizado, limitando o debate e as trocas de conhecimento. No fim, o uso da EAD reforça um ensino tecnicista e bancário, em que o importante é decorar o conhecimento repassado por hologramas, ficando o estudante a mercê das suas capacidades individuais, ignorando os conhecimentos já adquiridos e as dificuldades de aprendizagem que aparecem nesse processo.

Os impactos da pandemia serão intensos na formação de nossos estudantes e o melhor a fazer é reconhecer esta realidade e começar a lidar com ela, ao invés de criar uma maquiagem via “ensino através de práticas não presenciais”. Nossas crianças estão – entre outros problemas – sendo impactadas em muitos casos pela perda de entes queridos, desestruturação econômica da família – quando há -, perda de emprego dos pais.

Entendemos que o mais importante nesse momento é auxiliar as famílias das crianças nas dificuldades mais imediatas que estas possuem, oferecendo apoio psicológico e estrutural, para que possam manter o isolamento social. O vínculo com a escola pode ser mantido através do envio de atividades de apoio, a cada duas vezes na semana, porém sem valor curricular.

Querer que em meio a tudo isso a aprendizagem das crianças siga seu curso normal via práticas à distância é no mínimo uma grande ilusão, sem falar da insensibilidade. Teremos que tratar destes impactos com nossos estudantes e criar formas de que processem esta realidade, sem o que a aprendizagem estará comprometida para os mais atingidos.

É claro que a família pode fazer algo nesta direção, mas não com a expectativa de que isso possa substituir a atuação do magistério nas salas de aulas das escolas do país. Muito pelo contrário: os pais estão demonstrando ter consciência dos problemas para cumprir com estas expectativas – o que, ademais, é absolutamente normal que seja assim.

Neste sentido, questionamos a plataforma construída pela prefeitura de Goiânia, estabelecida de forma autoritária, sem um debate com os/as professores/as e com a comunidade, os quais não foram convidados a participar desse processo, mesmo sendo um dos principais sujeitos no processo de formação dos estudantes. As soluções propostas, usadas com a intenção de substituição do trabalho do professor pelo uso de plataformas, estão fadadas ao fracasso e a acelerar a desigualdade educacional. Ressaltamos a importância da participação de todos, inclusive que os professores tenham contato com seus alunos a fim de manter o vínculo afetivo dos estudantes, buscando meios de atingir a todos, uma vez que não há que se falar neste momento em aulas no modelo formal, nem poderá ser encarada como substituta dos dias letivos nas escolas e CMEIs. O mundo inteiro parou e quando voltar a rodar, no tocante às pessoas, quando não existir mais a necessidade do isolamento social, as coisas serão diferentes e isso inclui os pais, professores, diretores, coordenadores e estudantes. Portanto, não se deve apresentar respostas prontas para uma realidade que ainda não se sabe onde vai parar. Neste sentido, questionamos neste momento a validade deste ano letivo, inclusive para as escolas particulares, uma vez que por estes métodos improvisados, ainda que com muito esforço, não serão garantidas uma efetiva educação saudável em seus aspectos mais relevantes. Assim, questionamos também a sobrecarga de muitas escolas particulares, quando estão sobrecarregando os estudantes com atividades, sendo que neste momento o principal foco tem que ser a saúde física e mental de todos.

Ressaltamos a importância de que em qualquer resposta, seja considerada as diversas realidades das crianças, com atenção especial a situação das famílias pobres que não tem acesso, e que pelo plano dessa gestão, serão as que estariam mais expostas ao vírus por ter que frequentar as aulas presencialmente, enquanto as que tem acesso às tecnologias continuariam on-line, no distanciamento social. Isso não será bom para nenhuma das partes e principalmente será um trato injusto que configura exclusão de classe escancarada para as crianças e adolescentes.

Com base em todos estes elementos levantados, entendemos que estes dois anos, 2020 e 2021, deveriam constituir um ciclo único, apenas com avaliações de diagnóstico conduzidas pelos professores, dando tempo às redes para atuar na recuperação dos desempenhos segundo suas realidades específicas. Não é hora de meritocracia, de educação bancária, nem de exclusão. O momento exige principalmente de nós e dos organismos educacionais, maior sensibilidade, solidariedade e acolhimento.