Publicamos o posicionamento sobre a Base Nacional Comum
Curricular (BNCC) construído por alguns professores da Escola Municipal Pedro
Costa de Medeiros, aprovado em Assembleia Geral dos Trabalhadores da Educação
Municipal de Goiânia ocorrida no dia 15 de maio. Também ficou aprovado que
outras pessoas poderão dar sugestões para a publicação de uma outra versão,
tendo como base o presente texto abaixo.
'A
toque de caixa' a Secretaria Municipal de Educação de Goiânia (SME) está
tentando empurrar 'goela abaixo' a proposta da BNCC para a Rede Municipal. De
uma noite para a outra inseriu a Base como pauta dos planejamentos de Abril e
Maio, dando pouco mais de um mês para que as escolas organizem propostas de
currículo que 'servirão como referência' para uma nova orientação pedagógica em
nível municipal, adaptadas às diretrizes da BNCC.
A BNCC
é um projeto educacional antipopular que corresponde aos interesses de
organismos multilaterais (Banco Mundial - BM, UNESCO e Fundo Monetário
Internacional – FMI). As políticas orientadas por essas instituições nos países
periféricos caminham em dois sentidos: o do sucateamento e desmonte do serviço
público e o da privatização. Ou seja, são políticas educacionais de cunho
neoliberal e conservador.
Alguns
aspectos sobre a BNCC devem ser considerados:
1) Processo de construção burocrático e antidemocrático:
A BNCC
foi aprovada em um processo antidemocrático. O Ministério da Educação (MEC)
anuncia 12 milhões de contribuições via internet para a elaboração da primeira
versão, o que não é o mesmo de contribuintes. O total de contribuintes não
ultrapassou o número de habitantes de uma cidade média brasileira (150 mil). A
pouca participação se deve aos mecanismos burocratizados e superficiais adotados
pelo Ministério. Diversas 'contribuições' são apenas respostas para perguntas
de múltipla escolha definidas previamente e muitas delas deslocadas de
objetivo. Ou seja, várias perguntas não tinham relação direta com a construção
de uma nova proposta pedagógica, e em inúmeras delas as únicas respostas
possíveis eram o 'sim' ou 'não'.
O MEC
também menciona a participação de 'especialistas' na construção da Base, mas
essas contribuições são no mínimo duvidosas quando nos deparamos com a posição
da Associação Nacional de Pós-graduandos em Educação (AnPed), contrária ao
conteúdo da Base.
2) Desconsidera o saber científico acumulado historicamente
pela humanidade.
A BNCC
promove uma 'algazarra' epistemológica quando considera os conteúdos das disciplinas
escolares como subdivisões de 'grandes áreas'. Vale ressaltar que Artes,
Educação Física, Inglês, Matemática, Geografia, História, Língua Portuguesa e
Ciências não são apenas disciplinas, elas são áreas de conhecimento.
Uma
área de conhecimento se consolida a partir de objetos de estudo e formas
específicas de olhar a realidade. Objetos e formas não estão 'soltos no ar',
emergem da própria vida. A formação de várias áreas não é uma 'invenção humana
desprendida de base real', é resultado do trabalho humano de aproximação entre
pensamento e realidade. Isso significa que reverter esse processo através do
agrupamento de áreas, desconsiderando suas especificidades é uma ação
anticientífica. E uma das funções da escola é oportunizar o acesso das crianças
aos saberes historicamente acumulados. A BNCC surge como entrave nesse
movimento.
3) Sucateia a formação nas escolas públicas, flexibiliza o
concurso para professores e precariza os cursos de licenciatura.
Com o
agrupamento de áreas os conteúdos aparecem como subdivisões dos 'grandes
eixos'. Por exemplo: os conteúdos de Educação Física, Inglês, Português e etc.
estão inseridos no eixo 'Linguagens'. Com o discurso de 'interdisciplinaridade'
a Base caminha para a extinção de várias disciplinas no ambiente escolar. Ao
invés de aulas de Educação Física e Artes, por exemplo, os conteúdos dessas
áreas poderão 'aparecer' em outros momentos, justificando sua ausência. Na
prática sabemos que esse discurso é falacioso. Inúmeros conteúdos serão
secundarizados e/ou excluídos da escola. Isso observando os colégios públicos,
pois nas escolas particulares os estudantes continuarão tendo acesso a várias
áreas do conhecimento, inclusive suas 'ramificações' (iniciação esportiva,
teatro, gramática e outras). A BNCC a médio e longo prazo irá aumentar o abismo
que existe entre a formação de alunos pobres e ricos, direcionando para alguns
apenas os elementos necessários para a inserção no mercado de trabalho e
oferecendo para outros a totalidade do saber científico.
Com a
redução de disciplinas a contratação de professores formados nessas áreas se
torna opcional. Isso tudo em um contexto de escassos investimentos na educação
pública, com números insuficientes de concursos e novas formas de contratação
de trabalho precário. Exemplo: recentemente a Rede Estadual de Goiás lançou
concurso para 900 vagas, numa realidade de déficit de quase 10 mil professores
e 20 mil temporários. E as vagas contemplam apenas as áreas de Matemática,
Física, Química e Biologia.
Por
fim, se a escola passa a não abrigar professores de áreas secundarizadas e/ou
excluídas do currículo, os cursos formadores desses profissionais também se
tornam 'desnecessários'. Isso resultará em mudanças a curto, médio e longo
prazo: alterações curriculares adaptadas às diretrizes da BNCC, 'enxugando'
cientificamente os cursos de graduação; fechamento de vagas e até mesmo de
cursos.
4) Retoma um modelo de formação mercadológico e ignora
questões de diversidade e inclusão.
A Base
retoma um modelo de formação baseado em 'habilidades e competências', distante
do sentido etimológico das palavras. Ela sobrepõe o 'saber fazer' ao 'saber'
pensar' e aproxima o primeiro dos interesses do mercado de trabalho, cada vez
mais distantes dos anseios humanos. Isso significa que todo o amadurecimento
coletivo feito no campo educacional em relação a necessidade de se ter uma
educação participativa, reflexiva e crítica, será descartado e 'arremessado na
lata de lixo'. Ademais, questões sobre diversidade de gênero e sexualidade
foram excluídas do documento. Um imenso retrocesso na educação brasileiras.
Enfim,
consideramos que a BNCC, mais do que uma proposta pedagógica é um projeto
político de desmonte da educação pública. Conclamamos todos os estudantes e trabalhadores
da educação para construir a luta e barrar os projetos educacionais de cunho
neoliberal e conservador em Goiânia e em todo território nacional, incluindo a
BNCC.
Barrar a BNCC!
Por um projeto de Educação construído pela base!
Goiânia, 11 de maio de 2018.